Comentário ao Acórdão n.º 482/19.7BESNT-A, do Tribunal Central Administrativo Sul, com referência à matéria da tutela cautelar no âmbito do contencioso administrativo - João Victor B S Lima - Aluno 59560

     No presente Acórdão, tem-se como tema central, à luz do disposto no artigo 121, CPTA, julgamento final que materializa e antecipa, em sede de providência cautelar, a decisão de um processo principal, constante de mesmo objeto. 

Foi interposto recurso desta decisão, com o fim de se discutir a legalidade da convolação efetuada, designadamente por se entender que o juiz não dispunha de todos os elementos necessários para decidir de fundo em virtude de ainda não ter sido instaurado o processo principal ou por se entender que não se verificavam os requisitos de simplicidade e urgência, aquando da data do despacho, 07 de janeiro de 2019.

 “A”, ora recorrente, manifestou a sua não posição à antecipação da decisão sobre a causa principal. No entanto, por sentença do Tribunal Administrativo, em antecipação do juízo sobre a causa principal, a ação foi julgada improcedente. Inconformada com a decisão, “A” alegou que a sentença se encontrava ferida de nulidade, por contradição entre factos provados e a sucessiva fundamentação. Requereu então, reabertura do caso para que seguisse a fase de produção de provas. 

“R”, ora recorrido, contra-alegou dizendo que o presente recurso não mais é do que a tentativa da ora Apelante de obter um novo julgamento a ocorrer em sede de ação principal, dado que a primeira sentença, proferida nos termos do artigo 121, CPTA, já lhe foi desfavorável. Ainda, sustentou que ambas as partes foram notificadas e aceitaram a antecipação da decisão para sede cautelar, sem que fosse deduzida qualquer oposição. 

O Tribunal fez questão, de apreciar e decidir sobre quatro questões fundamentais ao caso, quais sejam: (I) da violação do caso julgado, ao pretender manter a aplicação do mecanismo previsto no artigo 121, CPTA; (II) da violação do caso julgado, relativamente à insuficiência da matéria de facto e às razões para a necessidade da sua ampliação a nível probatório; (III) da violação dos deveres dos tribunais; (IV) da violação dos princípios da tutela jurisdicional efetiva e o princípio da igualdade das partes; (V) A falta de expressão de qualquer fundamentação no que respeita à alegada necessidade de realização da diligência de audição de testemunhas por meios de comunicação à distância.

Por sua vez, decidiu o Tribunal revogar o despacho que antecipava a decisão da causa principal, face ao artigo 121, CPTA, sendo certo que ordenou que os autos fossem baixados a tribunal inferior para que retomassem a normal sua tramitação, à luz do artigo 120, CPTA.

Cabe, agora, fazer referência à matéria da tutela cautelar no âmbito do contencioso administrativo. Face a um processo declarativo, já intentado ou a intentar, o autor pede ao tribunal a adoção de uma ou mais providências, com o intuito de impedir que, durante a pendência do processo declarativo, se constitua uma situação irreparável ou se produzam danos de tal modo graves que coloquem em perigo a utilidade da decisão que se pretende obter naquele processo.  

Dentre as características de um processo cautelar, temos: (I) a instrumentalidade, visto que só quem possui legitimidade ativa para intentar processo principal é que pode intentar um processo cautelar; (II) provisoriedade: certo que uma providência cautelar não poe antecipar, a título provisório, a produção do mesmo efeito que a decisão a proferir no processo principal determinar a título definitivo; (III) Sumariedade: o tribunal fica adstrito a fazer um juízo de valor sumário sobre factos que podem vir a prejudicar direitos ou acarretar situações irreversíveis, em função do processo principal. 

Há que se enunciar a posição do Senhor Professor Vasco Pereira da Silva, relativamente às espécies das providências cautelares. Atualmente há uma formulação aberta e não tipificada, sendo certo que o Professor afirma ter o legislador adotado uma lógica simples, parte da cláusula geral e depois defende alguns exemplos, previstos no artigo 112/2, CPTA. 

Importante é salientar, como acontece no caso, que as tutelas cautelares podem ser requeridas em momento anterior ou após a propositura da ação principal, conforme artigo 114/1, CPTA. Não há qualquer prazo dentro do qual possa ser requerida, salvo sob sujeição de prazo face a ação principal. As formas dos processos cautelares vêm identificadas nos artigos 114 a 119, do CPTA.

Após a revisão do CPTA de 2015, os critérios para emissão de providências cautelares foram homogeneizados. É certo que devemos ter em atenção, por sua vez, o artigo 120, números 1 e 2, do CPTA, uma vez que, do previsto neste artigo, infere-se que constituem condições de procedência das providências cautelares: (I) o “periculum in mora”, baseado no receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação; (II)  o “Fumus boni iuris”, baseado na alta probabilidade de que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente; e, (III) a ponderação de todos os interesses em presença, segundo critérios de proporcionalidade. 

Postas algumas das características gerais das tutelas cautelares, há que se relacionar o caso com a aplicação da norma prevista no artigo 121, do CPTA. Este artigo prevê a possibilidade de convolação do processo cautelar em processo declarativo, através da antecipação, no processo cautelar da decisão sobre o mérito da causa. Pode-se dizer que assume uma função de garantia, bem como economia processual, quando preenchidos dois requisitos, ora a deteção da situação substantiva que justifique a antecipação do juízo sobre o mérito da causa, cumulado com a audição das partes sobre a junção de todos os elementos que permita esta antecipação.

No presente caso, abstraindo da valoração sobre quem tem ou deixa de ter razão, é facto de que a matéria probatória é deficiente. Neste sentido, acaba por falhar a alta probabilidade de que a pretensão formulada no processo principal venha a ser julgada procedente e, consequentemente, a ponderação de todos os interesses, segundo critérios de proporcionalidade. Ora, claro é que falham dois requisitos da própria procedência das providências cautelares. 

Destarte, concluímos pela razoabilidade da decisão, uma vez que a fase probatória de qualquer processo é fundamental para qualquer consubstanciar qualquer alegação.



João Victor Beltrame Sawaya de Lima

Aluno n.º 59560

4 º ano A - Subturma 1

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A Legitimidade Ativa e a Ação Popular no Contencioso Administrativo

Impugnabilidade de pareceres vinculativos, à luz do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Proc. 0239/04

Análise do artigo 67.º, n.º4, alínea b) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos