O âmbito da jurisdição Administrativa: alcance e delimitação
No Contencioso Administrativo, trata-se do processo administrativo a par da sua materialidade, e atendendo ao artigo 209º/1 b) da CRP, encontramos a disposição referente à criação da jurisdição administrativa, ao que, no artigo 202º/1 da CRP, vem inscrita a definição da função jurisdicional. Decorrendo do facto de que o artigo 209º estabelece em geral todas as categorias dos vários tribunais, temos duas grandes categorias de jurisdição: os tribunais comuns e a ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Ao contrário do que acontece em Espanha, e à semelhança de França, Alemanha e Itália, Portugal possui um sistema de repartição jurisdicional dualista: são duas ordens jurisdicionais diferentes, com hierarquias diferentes, não se imiscuindo entre si. A estrutura dos tribunais administrativos e fiscais difere um pouco da dos tribunais judiciais, onde, no topo da hierarquia, encontramos o Supremo Tribunal Administrativo, nas relações (segunda instância) deparamo-nos com o Tribunal Central Administrativo Norte e Sul, e em primeira instância temos 16, que estão enumerados pelo DL 325/2003.
Para aferir a competência, como trave-mestra do
âmbito de jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais, teremos de
atender ao artigo 212º/3 da CRP, que estriba as competências dos tribunais
administrativos e fiscais. Concretizando com o artigo 4º do ETAF, que nos
confere uma definição da relação jurídica administrativa, como principal linha
orientadora para definir o critério de intervenção dos TAF, temos o seu objeto: a
jurisdição administrativa é encarregue de dirimir os litígios das relações
jurídicas administrativa e fiscal. Para
o efeito, atenda-se à definição dada por um Acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo, que nos diz que, apesar de não encontrarmos descrição legal “não
impede que possamos considerá-la, para este efeito, como uma relação que se
estabelece entre dois ou mais sujeitos regulada por normas de direito
administrativo, em que um desses sujeitos é uma entidade ou um órgão da
Administração Pública que atua no exercício dos poderes de autoridade que lhe
são próprios com vista à satisfação do interesse público.”
Contando com o alcance da definição material, uma primeira
opinião do Tribunal Constitucional foi no sentido de atribuir aos Tribunais
Administrativos uma reserva absoluta de jurisdição, atendendo ao facto em que
os mesmos apenas poderiam julgar questões de direito administrativo como de que
tais questões só poderiam ser tuteladas por esses mesmos tribunais. Assim, as
leis que conferissem aos tribunais administrativos legitimidade para dirimir
questões que não fossem oriundas de relações jurídicas administrativas seriam
então inconstitucionais. Posteriormente, alguma doutrina veio admitir a
possibilidade de atribuição aos tribunais administrativos a possibilidade de resolução
de litígios referentes à atividade da Administração, desde que respeitassem as
relações ou incluíssem aspetos de direito privado. Por fim, sob a esteira de
Sérvulo Correia, será necessário estatuir uma regra definidora de um modelo
típico, que seja volátil ao ponto de permitir adaptações ou desvios em casos especiais,
desde que não fique prejudicado o cerne caracterizador do modelo
administrativo.
Concluindo, e atendendo ao princípio da separação de poderes ínsita no
artigo 111º da Constituição da República Portuguesa, procura-se delimitar a atuação dos tribunais
administrativos, concomitantemente com a evidente proibição de os demais tribunais se poderem imiscuir no âmbito jurisdicional dos TAF. Assim, e atendendo ao princípio da plena jurisdição dos Tribunais administrativos, é lhes reconhecido o poder de emitir todo o tipo de providências contra a Administração, dado o facto de que esta possui uma maior familiaridade com o âmbito procedimental e técnico, conforme
se verifica no disposto no artigo 3º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos.
Bibliografia:
- SILVA, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo
no divã da Psicanálise – Ensaio sobre as acções no novo Processo
Administrativo”;
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